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Ghosting: o que é e o que fazer a respeito?

Ghosting é o sumiço repentino de alguém que se relacionava com você. Se isso acontecer, deixe-o ir com sua imaturidade e covardia.

Ghosting: o que é, porque dói e o que fazer a respeito?

| Tempo de leitura: 14 minutos |

“Ghosting” é um termo coloquial que define o término repentino de uma relação sem explicações ou aviso prévio, seguido do corte total de contato com a outra pessoa. Em outras palavras, o indivíduo desaparece da vida do outro como um fantasma, ignorando mensagens, ligações ou qualquer tentativa de comunicação do parceiro, amigo ou colega.

Psicologicamente, trata-se de uma forma extrema de evitação de conflito, em que a pessoa que some busca evitar o desconforto emocional de uma conversa de despedida.

Especialistas chegaram a descrever o ghosting como um comportamento passivo-agressivo de crueldade emocional, uma espécie de “tratamento do silêncio” contemporâneo.

Importante notar que o ghosting não ocorre somente em namoros. O termo se expandiu para amizades, relações familiares e até contextos profissionais. Por exemplo, no ambiente de trabalho, fala-se em ghosting quando candidatos somem após a entrevista ou quando empregados abandonam o emprego sem aviso.

Em qualquer âmbito, a característica central é a falta de “responsabilidade afetiva” – isto é, não comunicar claramente o fim da relação, deixando o outro no completo silêncio.


Por que o ghosting se tornou tão comum hoje em dia?

No cenário afetivo contemporâneo as relações estão fragmentadas, os códigos de convivência se tornaram voláteis e o sentimento de descartabilidade parece ter se naturalizado.

Em meio a aplicativos de encontros, mensagens instantâneas e redes sociais que aproximam e afastam com a mesma velocidade, o ghosting se transformou em uma prática quase normatizada, um triste sintoma da superficialidade afetiva em que estamos mergulhados.

Estamos conectados o tempo todo, mas será que estamos realmente “on”? Essa é uma das perguntas que mais reverberam quando falamos da banalização do desaparecimento emocional.

A hiperconectividade criou a ilusão de proximidade, mas muitas das relações que surgem nesse ambiente são tão rápidas quanto efêmeras. É comum que dois estranhos compartilhem intimidades intensas por alguns dias e, no dia seguinte, um deles suma sem vestígios: o famoso sumiço repentino. Como se aquele vínculo não tivesse sequer existido. Trata-se de um encerramento invisível, sem direito à elaboração emocional.

Outro elemento importante é o “espírito da época”: uma cultura cada vez mais acelerada, performática e orientada por gratificações imediatas. Por trás dessa constatação ácida, há um cansaço afetivo, uma exaustão de investir em vínculos que começam intensamente e terminam no vazio de uma notificação ignorada. Não é raro que pacientes se perguntem: “vale a pena tentar de novo?

O ghosting prospera onde falta profundidade, empatia e escuta. Numa sociedade que valoriza mais a performance do que a presença, mais o marketing pessoal do que a vulnerabilidade, torna-se fácil ver o outro como algo substituível.

E quando o outro vira “coisa”, o sumiço sem aviso se torna apenas uma opção entre tantas: cruel, mas prática. No fundo, o crescimento do ghosting diz menos sobre tecnologia e mais sobre o empobrecimento da nossa capacidade de sustentar o afeto em tempos líquidos.


Perfil psicológico de quem pratica ghosting

Quais características são associadas àqueles que costumam “sumir” dos relacionamentos? Evidências sugerem que certos traços de personalidade e estilos emocionais tornam um indivíduo mais propenso a dar ghosting.

De modo geral, perfis evitativos se destacam: pessoas com grande desconforto em lidar com confrontos ou emoções negativas tendem a enxergar o ghosting como uma saída conveniente para evitar conflitos. Essas pessoas têm dificuldade em expressar abertamente suas insatisfações ou dizer “não” e, ao invés de enfrentar uma conversa difícil, preferem escapar silenciosamente.

Indivíduos mais inclinados ao ghosting costumam apresentar comportamentos evasivos, manipulativos e autocentrados. Em outras palavras, faltam-lhes empatia e maturidade emocional para lidar de forma responsável com os sentimentos do outro.

     

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De fato, egocentrismo e baixa empatia são apontados como fatores-chave de quem coloca seu próprio conforto acima do respeito pelo outro, ignorando o impacto alheio.

Pesquisas em psicologia traçaram paralelos entre o ghosting e a chamada tríade negra da personalidade (narcisismo, maquiavelismo e psicopatia). Indivíduos com pontuações mais altas nesses traços sombrios são significativamente mais propensos a usar o ghosting como método de terminar relacionamentos, especialmente os de curto prazo.

Esses traços envolvem frieza emocional, tendência a manipular e falta de remorso, características que facilitam descartar pessoas sem olhar para trás. Quem tem níveis elevados de narcisismo e psicopatia vê no ghosting uma solução eficaz e de baixo custo para se livrar de parceiros indesejados e ficar disponível a novas oportunidades, ou simplesmente para evitar compromissos mais sérios.

Entretanto, nem todos que ghostam se enquadram em perfis antissociais. Muitos são pessoas comuns, porém com imaturidade emocional ou medo da vulnerabilidade. Essas pessoas não deixam claras suas intenções porque têm medo de ser transparentes, temem parecer fracas ao admitir que não querem prosseguir na relação.

Nessa ótica, o ghosting aparece como uma saída fácil para evitar o desconforto de ferir sentimentos face a face. É a coragem de desaparecer em vez da coragem de dialogar.

Além disso, alguns casos de ghosting estão ligados a questões pessoais, como por exemplo, alguém com depressão ou ansiedade social pode se isolar abruptamente (autoisolamento), não por maldade, mas por incapacidade de continuar se relacionando naquele momento.

Há também quem recorra ao ghosting por motivos de segurança pessoal, como interromper contato com alguém que mostrou comportamento agressivo ou abusivo. Nestes casos, o silêncio é uma forma de autoproteção legítima.

Todavia, na maioria das situações, predominam mesmo a falta de habilidade ou disposição para comunicar sentimentos de forma responsável.

Vale mencionar um dado curioso de uma enquete informal:

  • 81% dos ghosters disseram que “simplesmente não estavam tão a fim” da pessoa;
  • 64% apontaram algo que a outra pessoa fez e de que não gostaram, e;
  • 25% admitiram que agiram por estarem com raiva do interlocutor.

Ou seja, na maioria das vezes o ghosting não decorre de grandes mistérios, mas de desinteresse ou incômodo, aliados à dificuldade de expressar isso abertamente.

Em suma, o perfil típico de quem pratica ghosting combina:

  • Evitação de desconforto;
  • Baixa empatia;
  • Comunicação deficiente e, por vezes;
  • Traços de egoísmo ou narcisismo.

É alguém que opta por poupar a si mesmo do constrangimento ou responsabilidade à custa do outro, agindo como se o outro não merecesse nem mesmo uma palavra final.


Quem pratica ghosting costuma voltar?

Muitas pessoas que passaram pela experiência dolorosa de um abandono digital se questionam frequentemente: “será que quem some sem explicação pode reaparecer?

Em minha prática clínica, percebo que, infelizmente, a resposta para essa pergunta costuma ser sim. Contudo, é essencial entender as razões e as implicações psicológicas por trás desse retorno.

Alguns indivíduos que optam pelo corte de contato sem explicação voltam após um período, impulsionados por sentimentos como culpa, arrependimento ou, em muitos casos, por pura conveniência emocional.

Segundo um estudo realizado por LeFebvre e colaboradores (2019), aproximadamente 40% das pessoas que ghostearam alguém reapareceram após semanas ou até meses, muitas vezes agindo como se nada tivesse acontecido ou oferecendo desculpas superficiais (LeFebvre, 2019). Este comportamento, também conhecido como zombieing, demonstra um padrão relacional instável e emocionalmente imaturo.

Quando isso ocorre, o retorno quase nunca vem acompanhado de explicações satisfatórias. Frequentemente, o indivíduo evita mencionar o desaparecimento emocional anterior, tentando reconectar-se sem reconhecer o impacto que causou.

Essa atitude gera ainda mais confusão para quem já sofreu com o sumiço repentino, criando ciclos viciosos de expectativa e frustração. Em consultório, ouvi relatos como o de uma paciente que me disse certa vez: “Ele sumiu por meses e voltou dizendo apenas ‘saudades’. Isso me deixou ainda mais perdida e vulnerável.

Portanto, caso você vivencie o retorno inesperado de alguém que realizou um desligamento unilateral anteriormente, questione-se sobre suas próprias necessidades emocionais e limites pessoais. Será saudável reatar esse vínculo sem esclarecer o passado?

Relações saudáveis exigem comunicação clara e honesta; portanto, tenha cuidado antes de aceitar alguém que lhe ofereceu apenas uma ruptura silenciosa anteriormente. Avalie com serenidade e coloque sempre sua saúde emocional em primeiro lugar.


Ghosting é sempre intencional ou pode ser acidental?

Uma dúvida comum que escuto frequentemente no consultório é: o ghosting é sempre um ato consciente ou pode acontecer sem intenção? Essa questão é especialmente relevante porque determinar a intencionalidade ajuda quem sofre com o abandono digital a compreender melhor a situação, amenizando o impacto emocional.

Primeiramente, é verdade que grande parte dos casos de desligamento unilateral envolve uma decisão consciente. A pessoa, por diversas razões emocionais, opta por encerrar o vínculo sem enfrentar uma conversa difícil. Entretanto, também observo situações em que o ghosting pode acontecer de maneira involuntária, fruto de circunstâncias específicas. Por exemplo, pessoas enfrentando crises emocionais profundas, episódios de ansiedade ou depressão severa, se isolam completamente, cortando contato até mesmo com pessoas próximas, não porque desejam abandoná-las, mas porque simplesmente não têm forças ou clareza emocional para responder ou manter vínculos.

Outro cenário comum é o ghosting decorrente da sobrecarga digital. Com tantas conexões simultâneas nas redes sociais e aplicativos, algumas mensagens podem acabar se perdendo, especialmente quando a relação ainda é recente ou superficial.

Nesse caso, embora não haja uma intenção clara de desaparecer, o resultado é semelhante: um encerramento invisível que gera desconforto no outro lado.

Portanto, embora o ghosting frequentemente seja intencional e esteja associado a uma fuga relacional, existem sim situações em que pode ser acidental ou involuntário. Reconhecer essa possibilidade ajuda evitar personalizar excessivamente o episódio, reduzindo o sentimento de culpa ou inadequação.

Porém, independentemente da intenção, cabe sempre uma reflexão sobre responsabilidade afetiva: mesmo acidental, o abandono digital têm impactos profundos, e é essencial desenvolver uma comunicação mais consciente e cuidadosa nas relações contemporâneas.


Vale a pena insistir após levar um ghosting?

Após sofrer um ghosting, é natural sentir um forte impulso em tentar obter respostas. Muitas pessoas se perguntam se vale a pena mandar outra mensagem ou insistir na comunicação para entender o que aconteceu. Embora essa reação seja compreensível, é importante refletir sobre a eficácia e os impactos emocionais de tal atitude.

É fundamental reconhecer que o ghosting é uma forma de comunicação por si só, um silêncio abrupto e intencional. Insistir prolongará a sensação de angústia e insegurança, já que, frequentemente, novas mensagens continuarão sem resposta, intensificando a rejeição sentida. Além disso, o insistir constante alimentará ciclos de ansiedade, ruminação mental e desgaste emocional.

Por outro lado, enviar uma mensagem única e curta, manifestando surpresa pelo desaparecimento emocional e abrindo espaço para esclarecimentos, ajuda no fechamento psicológico. No entanto, é essencial ter consciência de que a resposta pode nunca chegar, e estar preparado emocionalmente para seguir adiante independentemente disso.

Na prática clínica, recomendo que meus pacientes avaliem cuidadosamente suas intenções ao mandar uma nova mensagem após um sumiço repentino:

  • Se a motivação for obter algum tipo de encerramento emocional, uma única mensagem direta e respeitosa ajudará;
  • Se a intenção é resgatar a relação ou forçar uma explicação que o outro já demonstrou não querer dar, insistir provavelmente só gerará mais sofrimento emocional.

Portanto, a decisão de mandar ou não outra mensagem após um ghosting deve ser pautada pelo autocuidado e pela clareza emocional. Pergunte-se: “estou buscando respostas reais ou estou preso à expectativa de que a outra pessoa me forneça algo que talvez nunca aconteça?

Esse autoconhecimento será determinante para superar a experiência do ghosting com mais leveza e amadurecimento emocional.


Será que você fez algo errado para sofrer ghosting?

Se você já foi vítima de um sumiço repentino, é provável que tenha passado pela angústia do autoquestionamento. “Será que eu fiz algo errado?“, “Será que fui insuficiente?“, “Onde errei?“, são perguntas comuns em meu consultório.

A sensação de culpa e insegurança pode se instalar profundamente, levando a um ciclo doloroso de dúvidas e questionamentos sobre seu valor pessoal ou sua capacidade de manter relacionamentos.

É importante compreender que o ghosting raramente tem a ver com algo específico que você tenha feito. Muitas vezes, o desaparecimento emocional acontece pela incapacidade da outra pessoa de lidar com situações difíceis ou pela falta de maturidade emocional para uma comunicação aberta e honesta.

Em outras palavras, você pode estar se culpando por um comportamento que reflete muito mais a dificuldade emocional de quem decidiu sumir, do que um erro seu.

No entanto, o sentimento de culpa pode ser muito intenso. A ausência de explicações deixa espaço aberto para que suas inseguranças cresçam. Esse processo psicológico é chamado de ruminação mental, no qual você repassa obsessivamente todos os detalhes da relação em busca de um motivo plausível para o abandono.

Mas lembre-se: embora seja saudável refletir sobre seus comportamentos em relações, culpar-se pelo sumiço do outro é extremamente prejudicial para sua autoestima.

Por isso, recomendo sempre aos meus pacientes uma abordagem compassiva consigo mesmos. Pergunte-se com sinceridade: “Posso ter errado em algo, mas será que isso justificaria um desaparecimento abrupto?“.

Ao compreender que o ghosting revela muito mais sobre a outra pessoa do que sobre você, será possível reduzir a culpa e recuperar sua confiança emocional, direcionando sua energia para relacionamentos mais saudáveis no futuro.


Impactos emocionais

Do ponto de vista de quem é abandonado (ghostee), o ghosting produz forte sofrimento psicológico. Estudos sugerem que terminar um laço dessa forma é percebido como um dos modos mais dolorosos de rompimento, comparável ou até pior do que términos com confronto direto.

A pessoa ghosteada frequentemente experimenta sentimentos de rejeição e ostracismo, por ter sido excluída sem explicação. A ausência total de contato ou feedback gera uma falta de fechamento (closure), deixando a vítima em um estado de luto ambíguo, um tipo de pesar complicado que ocorre quando não sabemos ao certo por que ou como a relação terminou.

O ghosting desencadeia uma perda ambígua, um luto sem corpo: a pessoa amada está viva, porém ausente, e a falta de esclarecimento torna o luto confuso e prolongado (mantém-se a esperança de retomar o contato, diferentemente da morte definitiva).

A reação emocional a esse silêncio ensurdecedor costuma incluir tristeza, ansiedade, frustração e muita ruminação mental. É comum que o indivíduo abandonado relembre incessantemente os últimos contatos, buscando pistas do que “fez de errado“.

Na ausência de informações o ghostee preenche as lacunas com hipóteses muitas vezes piores que a realidade, entrando em um ciclo de autoquestionamento: “Será que falei algo errado? Fui insuficiente? Sou impossível de amar?“.


Referências

  • Bauman, Z. (2004). Amor Líquido – Sobre a Fragilidade dos Laços Humanos. Rio de Janeiro: Zahar.
  • Carvalho, P. (2021). Ghosting e falta de empatia: como responsabilidade emocional afeta relações. UOL VivaBem.
  • Franco, M. G. (2023). Citação em Psychology Today: “Ghosting triggers ambiguous loss…”.
  • Gouveia, P. (2021). Declaração em entrevista: “Responsabilidade afetiva é assumir seu lugar nas expectativas…”. UOL VivaBem.
  • Jonason, P. et al. (2021). Dark Triad traits and ghosting in relationships. University of Padua Study (Divulgado por Visão).
  • LeFebvre, L. E., Rasner, R. D., & Allen, M. (2019). “I guess I’ll never know…”: Non-Initiators Account-Making After Being Ghosted. Journal of Loss and Trauma, 25(5), 395-415.
  • Muller, R. T. & Morales, D. S. (2023). Unapologetically Gone: The Lasting Harm of Ghosting. Psychology Today.
  • Navarro, R. et al. (2020). Ghosting y breadcrumbing: prevalencia… entre jóvenes adultos. Escritos de Psicología, 13(2).
  • Perel, E. (2017). Relationship Accountability and the Rise of Ghosting. EstherPerel.com (Blog).
  • Safronova, V. (2015). Exes Explain Ghosting, the Ultimate Silent Treatment. The New York Times.
  • Soares, C. (2021). ‘Ghosting’: Partir sem deixar rasto é uma questão de (falta de) caráter?. Revista Visão.


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