A resposta curta é: depende. Se o que você contar não colocar ninguém em risco agora, nem você, nem terceiros, o psicólogo vai ouvir, anotar, fazer cara de “tô processando” e seguir com a sessão.
Mas se a coisa for grave, atual e perigosa, ele deve quebrar o sigilo. E sim, isso inclui avisar a polícia, Conselho Tutelar ou outro órgão.
Ao longo deste artigo, você vai entender como funciona o sigilo profissional na psicologia, e por que ele não é tão absoluto quanto o do advogado ou do padre.
Abordo as regras, exceções, dilemas e até as tretas éticas que o psicólogo enfrenta quando ouve algo comprometedor. Nada de blá-blá-blá jurídico difícil: só explicação clara, com linguagem de gente real.
Você também vai descobrir o que o psicólogo deve fazer se você confessa, insinua ou planeja um crime, como ele decide se precisa agir, e o que acontece com ele (e com você) se o sigilo for rompido injustamente.
Por que vale a pena ler este artigo até o fim?
- Porque você vai deixar de lado o medo de falar na terapia como se estivesse numa sala de interrogatório;
- Vai entender até onde vai o sigilo, e onde ele se rompe;
- Vai saber o que fazer se quiser desabafar sobre algo pesado, sem virar meme na delegacia;
- E, de quebra, vai rir um pouco, porque aqui a gente fala de coisa séria com leveza (mas sem passar pano).
1. Ele é obrigado a denunciar às autoridades?
Na maioria dos casos, não. O psicólogo tem o dever de sigilo, o famoso “boca de siri profissional“. Mas… tem exceções. (Sempre tem, né? Nem o segredo do cofre da vó escapa de certas situações.)
O que é esse tal de sigilo profissional?
O sigilo é tipo um contrato invisível entre você e o psicólogo. O que você fala no consultório, fica no consultório. É como Las Vegas, só que com menos luzes e mais choro.
Esse sigilo é garantido por lei (Código de Ética Profissional do Psicólogo, Art. 9º e 10º) e serve para você se sentir seguro ao abrir o jogo.
Mas atenção: o sigilo não é um superpoder absoluto. Não transforma o psicólogo em cúmplice ou escudo humano.
Quando o psicólogo pode abrir o bico?
A regra é: só quebra o sigilo se houver risco real e atual para você ou para outras pessoas.
Veja alguns exemplos:
Situação | Pode quebrar sigilo? |
---|---|
Você matou uma galinha em 1998 | Não |
Você ameaça matar o vizinho hoje à noite | Sim |
Você bateu o carro fugindo da polícia | Depende |
Você está planejando um crime | Provavelmente sim |
Em geral, se o crime já passou e não há risco para ninguém agora, o psicólogo guarda o que você contou. Mas se o que você disser envolver violência em andamento, abuso de menor ou ameaça de morte, aí ele vai acionar as autoridades ou outro profissional.
Mas não é traição?
Pode parecer. Mas pense assim: o psicólogo não tá lá pra te ferrar, e sim pra te ajudar a não ferrar mais ninguém, incluindo você mesmo. O sigilo existe pra proteger o vínculo, mas a vida e a segurança das pessoas vêm primeiro.
Então, se você falar algo do tipo “tô pensando em fazer uma besteira com fulano“, o psicólogo vai sim buscar ajuda, e talvez te oriente a se entregar de forma mais suave.
Se o psicólogo quebra o sigilo sem motivo legal ou ético, ele será processado, punido pelo Conselho de Psicologia e até perder o registro profissional.
Agora vamos falar sobre quando o psicólogo pisa na bola, e o que você pode fazer se ele abrir a matraca sem ter motivo.
2. O que acontece se o psicólogo quebrar o sigilo sem base legal?
Se o psicólogo abrir a boca sem ter motivo legal ou ético pra isso, ele levará chumbo grosso. E você, como paciente, poderá entrar com processo e pedir indenização. Porque não é só feio: é crime, é infração ética, e é quebra de confiança.
Psicólogo não é fofoqueiro profissional
Quando você conta algo na terapia, você tá abrindo o coração, as entranhas emocionais e, às vezes, uns podres também.
Se o psicólogo resolve contar isso pra terceiros, sem risco à vida, sem autorização, sem necessidade, ele tá quebrando o código de ética e jogando a profissão no lixo.
E a punição pode vir de três lados:
- Do Conselho Regional de Psicologia, com advertência, suspensão ou até cassação do registro.
- Do Judiciário, com processo por danos morais (e às vezes materiais).
- Da sociedade, com fama de antiético e zero pacientes no consultório.
E como você deve agir?
Se você se sentiu prejudicado, o caminho é:
- Reúna provas: gravações, prints, testemunhas.
- Faça uma denúncia ao Conselho de Psicologia: o site do CRP da sua região tem canal próprio.
- Procure um advogado: principalmente se você quiser pedir indenização na Justiça.
Simples assim. E necessário, porque o sigilo não é só regra interna da psicologia. Ele é um direito seu como paciente.
Mas cuidado com confusões!
Nem toda quebra de sigilo é ilegal. Por exemplo:
- Se você autorizou por escrito, não tem crime.
- Se havia risco de vida, o psicólogo justificará.
- Se a Justiça determinou e havia base legal, terá sido forçado.
Por isso, antes de processar, tente entender o contexto. E, se puder, converse com outro psicólogo de confiança.
3. Existe alguma diferença se o crime aconteceu há tempo ou está acontecendo?
Sim, existe. Quando o crime já ficou lá no passado e não tem ninguém correndo perigo agora, o psicólogo geralmente mantém o sigilo. Mas se o “pecado” ainda tá fresquinho, ou se você planeja repetir a dose, aí o caldo pode entornar.
O tempo cura… ou pelo menos alivia a treta
Na prática, o psicólogo vai avaliar se o que você contou representa algum risco atual. E isso é importante: o foco não é no crime em si, mas no perigo que ele ainda pode causar.
- Matou alguém há 15 anos? Terrível, mas se não há mais vítimas potenciais, o psicólogo provavelmente não vai te denunciar.
- Tá batendo na esposa até hoje? Aí sim, meu caro, o sigilo irá pelo ralo.
Resumo da ópera: O que passou, passou. O que continua passando, preocupa. E o que ainda vai passar… bom, talvez você passe na delegacia.
Por que essa diferença?
O Código de Ética do psicólogo prioriza o bem-estar das pessoas envolvidas. Se o que você fez deixou feridas, mas não há perigo novo, o psicólogo vai te ajudar a lidar com isso, emocionalmente, não judicialmente.
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Mas se o que você fez ou faz põe outras pessoas em risco, aí ele precisa agir. Afinal, ética sem ação é só discurso bonito.
E como o psicólogo descobre se há perigo?
Ele vai analisar algumas coisas, tipo:
- Você mostra arrependimento ou tá rindo do que fez?
- Tem alguém vulnerável no meio (criança, idoso, parceiro)?
- Você tem histórico de repetir esse comportamento?
- Você diz que voltará a fazer?
Se as respostas acendem sinal vermelho, o psicólogo vai:
- Te alertar sobre os riscos legais;
- Sugerir que você procure um advogado;
- E em casos graves, sim, notificar autoridades.
Se o crime envolver criança ou adolescente em situação de abuso, o psicólogo é obrigado por lei a notificar o Conselho Tutelar ou outro órgão de proteção, mesmo que isso quebre o sigilo.
Na próxima seção, vamos bater na porta do tribunal: O psicólogo é obrigado a testemunhar contra você, mesmo que tudo tenha sido dito em segredo?
4. O psicólogo é obrigado a testemunhar contra você?
Pode ser chamado? Sim. É obrigado a falar? Nem sempre. O psicólogo pode ser convocado como testemunha, mas ele tem o direito e muitas vezes o dever de se recusar a contar o que ouviu em sessão. É tipo ser chamado pra fofoca e responder: “não posso comentar“.
Mas pera lá, o juiz não manda em tudo?
Muita gente pensa que só porque o juiz chama, todo mundo tem que abrir a boca. Mas a história é mais complexa. Psicólogos estão protegidos pelo sigilo profissional previsto em lei e no Código de Ética da profissão.
É como se o psicólogo tivesse um cofre na cabeça. E só abrirá se:
- O paciente autorizar por escrito, ou
- Houver risco grave à vida ou segurança de alguém.
Caso contrário, ele pode olhar pro juiz e dizer: “Excelência, com todo o respeito, vou ficar em silêncio que é mais seguro pra todo mundo.“
E se for processo criminal? A coisa muda?
Pode esquentar, claro. Mas até em processos criminais, o sigilo do psicólogo continua valendo. Ele irá até o tribunal, mas:
- Se o que for perguntado diz respeito a conteúdo confidencial de sessão, ele tem amparo legal para se recusar a responder.
- Em alguns casos, pedir apoio ao Conselho Regional de Psicologia para proteger o sigilo.
O importante é: psicólogo não é informante da polícia. Ele é profissional de saúde mental, não detetive particular.
Quando o psicólogo pode falar, então?
Vamos deixar isso bem claro com esta tabela:
Situação | Psicólogo pode falar? |
---|---|
Paciente autoriza por escrito | Sim |
Há risco de morte/abuso | Sim |
Juiz convoca sem justificativa | Não |
Crime já passou e não há risco atual | Não |
Alguns psicólogos levam uma cópia do Código de Ética na bolsa. Vai que o juiz força a barra e eles precisam lembrar que a profissão tem lei própria, sim senhor!
5. É possível que o psicólogo te incentive a se entregar?
Sim, é possível. O psicólogo não vai te arrastar pelos cabelos até a delegacia, mas ele deve, sim, te incentivar a assumir a bronca. Não por moralismo, mas como parte da sua evolução emocional e psíquica.
E não, isso não é chantagem emocional. Isso é terapia de verdade: ajudar você a encarar as consequências dos seus atos como um ser humano responsável (mesmo que com culpa no cartório).
Psicólogo não é padre
A função do psicólogo não é te absolver. É te ajudar a entender o porquê de você ter feito o que fez. E, se necessário, te apoiar a reparar o estrago, dentro do possível.
Por isso, ele dirá coisas como: “Já pensou que encarar isso pode ser o primeiro passo pra sair desse buraco emocional?“, “Como você se sentiria se assumisse a responsabilidade pelo que fez?“
Isso é provocar reflexão. Não é empurrar você pra cadeia, mas te puxar pra fora da negação.
E o que o psicólogo espera com isso?
Simples: que você pare de fugir. Porque a fuga constante consome energia, causa ansiedade, insônia e até problemas físicos.
Veja o que acontece quando você encara o problema com ajuda terapêutica:
Atitude | Possível resultado |
---|---|
Encarar o que fez com apoio | Alívio, recomeço, evolução |
Fugir e esconder tudo | Culpabilidade, medo, estagnação |
O psicólogo te oferecerá suporte, não punição. Vai ouvir seus medos, planejar com você os próximos passos, e até ajudar a buscar um advogado, se você decidir se entregar.
E se eu não quiser me entregar?
Tudo bem. A decisão é sua. O psicólogo não vai te obrigar. Ele vai apenas:
- Refletir com você sobre o impacto disso na sua vida;
- Mostrar as consequências emocionais de viver se escondendo;
- E respeitar sua escolha, desde que ela não envolva risco pra outras pessoas.
Assumir responsabilidades (inclusive legais) diminui sintomas de ansiedade e depressão em quem vive com culpa crônica.
Agora, bora fechar com chave de ouro, e com um toque de paranoia legítima: Se eu não confessar o crime, mas der muitas pistas… o psicólogo pode deduzir e mesmo assim me denunciar?
6. O psicólogo pode deduzir que você cometeu um crime e te denunciar?
Pode deduzir? Pode. Denunciar? Depende. Se o psicólogo juntar as peças e achar que você está só fazendo charadas sobre algo muito grave e perigoso, ele irá agir, mas só se houver risco atual e real para alguém.
Ou seja: “dar pistas” não te blinda. E o psicólogo não é burro.
Psicólogo também sabe fazer conta de 1 + 1
Se você disser:
- “Tem uma pessoa que eu conheço… que fez algo muito errado… envolvendo uma faca… num dia de fúria…” ou;
- “Digamos que eu , quer dizer, alguém, sabe onde está o corpo…”
O psicólogo pode, sim, entender que você está tentando aliviar a culpa sem se comprometer diretamente. Mas se o conteúdo indicar perigo iminente, o sigilo será quebrado.
O que define se ele denuncia ou não?
O mesmo de sempre: o grau de risco atual.
Veja esse resumão:
Situação | Ação do psicólogo |
---|---|
Pistas vagas e sem risco | Mantém o sigilo |
Pistas concretas com ameaça real | Denunciar |
Pistas + histórico perigoso | Provavelmente intervém |
Pistas só pra desabafar | Fica na terapia |
Se o que você disse é só parte do seu processo de lidar com a culpa, e não indica que vai repetir o erro ou machucar alguém, o psicólogo segue no modo terapeuta.
Agora, se o clima na sessão começa a parecer cena de crime prestes a acontecer, ele pode ter que tomar providências.
E isso é legalmente permitido?
Sim. Porque o que vale não é se você falou diretamente ou não, mas o que o psicólogo entendeu sobre a situação de risco. E ele vai sempre agir com base:
- Na proteção da vida;
- No Código de Ética;
- Na responsabilidade profissional.
Mas não vai sair correndo pro 190 só porque você falou “uma amiga minha fez algo errado“. Tudo tem contexto, e o psicólogo é treinado pra perceber isso.
Psicólogos escrevem anotações confidenciais sobre suas “pistas” e, em caso de emergência, usam esse material para justificar ações de proteção. Nada escapa ao prontuário.
E agora, o veredito final: Você pode falar sobre seus erros na terapia, sim. Só não transforme o consultório em uma trilha de migalhas de pão esperando que ninguém vá perceber. Psicólogo não é policial, mas também não é tonto.
Perguntas frequentes
- Se eu confessar um crime antigo, o psicólogo me entrega?
Só se o crime ainda estiver causando risco. Se já passou e ninguém mais corre perigo, o sigilo é mantido. - E se eu contar que cometi um crime ontem?
Depende do crime e do risco atual. Se alguém ainda estiver em perigo, o psicólogo pode agir. Se não, ele escuta e anota. - Confessar na terapia é como confessar na igreja?
Não. O padre dá perdão. O psicólogo dá reflexão, e em certos casos, boletim de ocorrência (via terceiros). - Posso confiar que o psicólogo vai guardar segredo pra sempre?
Se não houver ameaça, sim. Se houver, aí o sigilo vira questão de segurança. - O psicólogo vai me convencer a me entregar?
Sim. Mas não é pra te ferrar, é pra você parar de viver fugindo da própria consciência. - E se eu disser que “um amigo” cometeu um crime, mas for eu?
O psicólogo vai sacar o jogo. Se ele entender que há risco, agirá mesmo sem confissão direta. - Se ele me denunciar, posso processar ele?
Só se a denúncia for sem justificativa legal. Se houve risco real, ele estava no dever de agir. - Ele vai me avisar antes de ligar pra polícia?
Se der tempo, sim. Mas se a coisa for urgente, ele agirá antes e explicará depois. - O que acontece se ele contar pra alguém sem necessidade?
Aí ele dança bonito: será punido pelo Conselho e até judicialmente. - O psicólogo tem sigilo igual ao do advogado?
Não. O advogado guarda segredo até do apocalipse. O psicólogo quebra em casos de risco. - Posso contar um crime e pedir pra ele não anotar?
Não. Ele precisa registrar o que for relevante clinicamente, e isso inclui coisas sérias. - Se eu matar alguém e contar, ele me denuncia?
Se o crime foi no passado e não há mais risco, ele provavelmente mantém sigilo. Mas espere um clima tenso. - E se eu for psicopata e disser que vou matar de novo?
Aí sim, meu consagrado. Prepare-se pra intervenção. - O psicólogo será obrigado a testemunhar?
Pode ser chamado, mas pode se recusar, com base no sigilo profissional. - O psicólogo vai me julgar?
Não. O papel dele é entender. Mas julgamento de risco, esse ele faz rapidinho.
Palavras finais
Chegamos ao fim, e se você leu tudo até aqui, parabéns: você já entende mais sobre sigilo terapêutico do que muito estudante de psicologia perdido no primeiro semestre. Mas vamos recapitular o espírito da coisa?
O psicólogo não é polícia, juiz, cúmplice nem confessionário. Ele é um profissional treinado pra escutar sem julgar, acolher sem acobertar, e cuidar sem carregar você no colo pra sempre.
O que ficou claro neste artigo:
- O sigilo é a regra, e é sagrado. Mas não é absoluto;
- A exceção aparece quando alguém está em risco, seja você ou outra pessoa;
- Falar sobre um crime na terapia não significa automaticamente ser denunciado. Mas também não garante imunidade;
- Dar pistas demais sem assumir nada é arriscado, o psicólogo pode juntar as peças e agir, se necessário;
- Confessar com sinceridade é o primeiro passo pra uma mudança real, e o psicólogo está ali pra te ajudar, não te enterrar.
Se você cometeu um erro, carregar isso sozinho só aumenta o peso. A terapia será o único lugar onde você encara o espelho sem quebrá-lo. Mas pra isso funcionar, é preciso confiança. E entender que confiança também envolve responsabilidade.
- Quer usar a terapia pra desabafar? Ótimo.
- Quer usar a terapia pra evoluir? Melhor ainda.
- Quer usar a terapia pra tentar escapar das consequências do que você fez? Aí complica.
Se você está em dúvida sobre o que contar, fale da sua dúvida primeiro.
Diga: “Tô pensando em te contar uma coisa séria, mas tenho medo de você me denunciar.” Pronto. Essa frase já abre a porta certa, com respeito, com honestidade e com cuidado.
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