Existe uma prática silenciosa, e perigosamente comum, dentro da Psicologia clínica brasileira: a recusa sistemática de muitos psicólogos em oferecer um diagnóstico claro ao paciente.
Sob o disfarce de discursos bonitos como “não quero rotular”, “prefiro olhar para a subjetividade” ou “diagnóstico é reducionista”, o que se esconde é, na maioria das vezes, uma mistura de despreparo técnico, medo institucional e uma profunda falta de responsabilidade clínica.
Não dar um diagnóstico quando ele é necessário não é uma escolha filosófica. É uma forma de negligência.
Aqui vai uma lista com 5 coisas que você vai aprender ao ler o artigo até o fim:
- Por que tantos psicólogos têm medo (ou preguiça) de fazer diagnóstico?
- Como a cultura do “não rotular” virou uma desculpa conveniente para a omissão clínica?
- Quais são os seus direitos quando o assunto é diagnóstico psicológico?
- Os principais erros que os psicólogos cometem ao fugir do dianóstico;
- O que você, como paciente, pode fazer quando seu psicólogo não te dá um diagnóstico?
Se você está sofrendo, tem direito a respostas claras, bem fundamentadas e baseadas em evidências. O diagnóstico não é um castigo. É o primeiro passo para o cuidado real.
O mito do “não rotular”
A raiz desse mito é simples: psicólogos confundiram o ato de não reduzir a pessoa ao diagnóstico com o ato de simplesmente não diagnosticar. Como se o problema fosse a existência do diagnóstico em si, e não a forma como ele é comunicado e trabalhado.
Psicólogos de várias abordagens, principalmente os mais influenciados por linhas humanistas ou psicodinâmicas, têm um verdadeiro pavor de diagnosticar. O medo é que o paciente se agarre ao diagnóstico como uma identidade, como se fosse um novo signo do zodíaco: “Sou ansioso ascendente em TDAH, com lua em transtorno de personalidade“. Mas será que esse medo é tão justificável assim?
A falta de diagnóstico deixa as pessoas num limbo emocional, sem entender o que está acontecendo, sem um plano de ação e, muitas vezes, sem acesso ao tratamento adequado.
Sejamos sinceros, se a preocupação com o rótulo fosse realmente sobre o bem-estar do paciente, o mínimo que o profissional deveria fazer era explicar claramente o que está acontecendo.
Medo de processos éticos
Muitos psicólogos acham que dar uma hipótese diagnóstica numa sessão é o mesmo que emitir um laudo judicial com valor pericial. Spoiler: não é.
Sabia que você pode agendar sua consulta com apenas um clique?
O Código de Ética Profissional do Psicólogo (Resolução CFP nº 010/2005) não proíbe diagnóstico clínico. O que ele proíbe é o uso irresponsável, leviano ou sem base técnica do diagnóstico. Traduzindo: pode sim diagnosticar, desde que com critério, estudo e fundamentação.
Além disso, o próprio Conselho Federal de Psicologia possui documentos orientativos que reforçam que o psicólogo pode realizar avaliações, emitir pareceres e construir hipóteses diagnósticas no âmbito clínico.
Falta de atualização
O diagnóstico clínico não é chute, nem feeling, nem “intuição terapêutica”. Ele exige técnica, leitura, atualização constante e, muitas vezes, supervisão.
As classificações diagnósticas mudam. Novos transtornos são reconhecidos, critérios são atualizados, e até as formas de intervenção vão sendo revistas com base em novas evidências. Um psicólogo que não acompanha essas mudanças não está apenas desatualizado… está sendo negligente.
Você sabia?
O DSM-5 foi publicado em 2013, e a CID-11 começou a ser adotada oficialmente no Brasil em 2022. Se o seu psicólogo ainda cita o DSM-IV como referência… Alerta vermelho, meu amigo.
Você confiaria num piloto que nunca leu o novo manual de voo? Então por que confiar sua saúde mental a um profissional que não sabe diferenciar um episódio depressivo maior de um transtorno de personalidade? Lembre-se: falta de estudo não é estilo clínico… é negligência.
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Formação deficiente
A verdade é dura: muitos psicólogos simplesmente não aprenderam a diagnosticar durante a graduação. E pior, aprenderam que isso era coisa de psiquiatra, ou algo “perigoso demais” para ser feito por um psicólogo.
Enquanto outras áreas da saúde mental avançaram, muitas faculdades de Psicologia continuam presas numa visão romântica dos anos 70, como se estudar diagnóstico fosse uma traição aos princípios humanistas da profissão. A psicopatologia vira uma matéria para cumprir tabela, quando deveria ser uma das disciplinas mais importantes da formação clínica.
Você sabia:
Em muitos cursos, o número de horas dedicadas à prática diagnóstica é menor do que o tempo gasto com disciplinas optativas como “arte terapia com massinha de modelar” ou “psicologia da ludicidade em ambientes não-estruturados”. Pois é… Surreal, mas real.
Adivinha quem sofre com esse déficit de formação? Exatamente: você, que continua adoecendo enquanto o profissional que deveria ajudar está na dúvida se usa ou não o DSM como referência.
Agora imagine quantas pessoas ficaram sem diagnóstico… só porque alguém insinua que estudar psicopatologia era coisa de psiquiatra.
Desconhecimento sobre diagnóstico psicológico
Psicólogo não faz diagnóstico médico. Mas faz, sim, diagnóstico psicológico clínico ou, no mínimo, uma hipótese diagnóstica bem fundamentada. O problema é que muitos psicólogos confundem tudo. Acham que diagnóstico só existe se vier acompanhado de um laudo oficial, carimbado, protocolado, reconhecido em cartório e talvez até lido por um juiz.
Só falta colocar um fundo de música fúnebre na sala. Existe um medo quase cômico (se não fosse trágico) de que dar um diagnóstico é o mesmo que carimbar a vida da pessoa com um selo permanente: “Você agora é oficialmente depressivo! Boa sorte, até nunca mais!“
- Diagnóstico psicológico: construção teórico-clínica baseada em avaliação comportamental, entrevistas, observação clínica, testes psicológicos (quando necessário) e análise dos sintomas relatados. Ele pode (e deve) levantar hipóteses sobre transtornos como depressão, ansiedade, TDAH, transtornos de personalidade e muitos outros;
- Diagnóstico médico (feito por psiquiatras): é aquele que pode incluir exames físicos, neurológicos e leva à prescrição de medicamentos.
Você sabia?
O Conselho Federal de Psicologia (CFP), na Resolução 006/2019, reforça que o psicólogo pode e deve realizar avaliações psicológicas com finalidade diagnóstica.
Mas veja bem: os dois se complementam! Se o psicólogo não faz sua parte, o paciente nunca chega ao cuidado adequado.
Falta de instrumentos de avaliação adequados
Muitos psicólogos simplesmente não têm acesso, não sabem usar ou nunca foram treinados para aplicar os instrumentos que dariam suporte técnico ao diagnóstico. Resultado: preferem não diagnosticar a correr o risco de errar feio.
Testes psicológicos, inventários, escalas de rastreio… tudo isso existe por um motivo: ajudar o profissional a transformar percepções subjetivas em dados objetivos. Sem instrumentos adequados, o diagnóstico vira uma mistura de achismo com intuição. E vamos ser sinceros: você não paga sessão pra ser cobaia de feeling clínico.
Além disso, muitos psicólogos têm receio de investir em materiais caros ou nem sabem onde buscar capacitação de qualidade.
Agora imagine se fosse o seu filho, sua irmã ou você mesmo, passando por crises, sem saber o que tem… só porque o psicólogo do bairro decidiu que aplicar um inventário era “burocrático demais”. Quantas vidas ficam em pausa por falta de um simples protocolo de avaliação?
Você tem o direito de saber o que tem
Você não é criança para ser poupado da verdade clínica. Se existe um conjunto de sintomas que se encaixa em um quadro diagnóstico, o profissional tem a obrigação ética de levantar essa hipótese e discuti-la.
Diagnóstico não é favor, é parte da prestação de serviço clínico. O Código de defesa do consumidor, o Código de Ética Profissional do Psicólogo e a própria lógica básica de qualquer relação terapêutica respaldam esse direito.
O Código de Ética do Psicólogo (CFP – Resolução nº 010/2005) deixa claro: o psicólogo deve prestar informações claras ao paciente sobre os procedimentos adotados, incluindo avaliações e hipóteses diagnósticas.
Se o psicólogo se propõe a avaliar, escutar e intervir… ele também tem a obrigação de construir hipóteses diagnósticas quando os sintomas indicam a necessidade.
Agora pare e pense:
- Quantos meses (ou anos) da sua vida você já perdeu sem saber o que realmente tem?
- Quantas crises poderiam ter sido evitadas com um simples diálogo diagnóstico claro?
- Quantas sessões você ainda vai fazer antes de ouvir a verdade?
Resumo
Aqui está um resumo do que você aprendeu, organizado por tema e com linguagem direta e didática:
Problema | Resumo |
---|---|
O mito do “não rotular” | Psicólogos confundem não reduzir a pessoa ao diagnóstico com simplesmente não diagnosticar. |
Medo de processos éticos | O Código de ética permite o diagnóstico, desde que feito com responsabilidade e fundamentação técnica. O que é proibido é o uso leviano ou sem critério. |
Falta de atualização | Psicólogos desatualizados te colocam em risco ao não reconhecer sintomas e transtornos corretamente. |
Formação deficiente nas universidades | Psicólogos saem da graduação sem saber diagnosticar e com a falsa ideia de que isso é função exclusiva da psiquiatria. |
Desconhecimento sobre diagnóstico psicológico | Psicólogos confundem diagnóstico clínico com laudo médico. Eles podem (e devem) construir hipóteses diagnósticas baseadas em avaliação clínica. |
Falta de instrumentos de avaliação adequados | Sem ferramentas, acabam evitando o processo diagnóstico por medo de errar. |
Perguntas frequentes
- Por que meu psicólogo nunca me disse qual é o meu diagnóstico?
Sinceramente? Pode ser medo, falta de preparo ou aquela velha desculpa de que “não gosta de rotular”. - Psicólogo pode dar diagnóstico ou isso é coisa de psiquiatra?
Pode sim! Psicólogo pode (e deve) construir hipóteses diagnósticas baseadas na avaliação clínica. O que ele não pode é prescrever remédios. - Preciso fazer testes psicológicos para ter um diagnóstico?
Nem sempre. Testes ajudam muito, mas o diagnóstico começa a partir de entrevistas clínicas bem feitas, análise de sintomas e da história do paciente. - O psicólogo pode errar meu diagnóstico?
Claro que pode. Profissional bom também erra. Mas sabe o que é pior? Nem tentar fazer o diagnóstico por medo de errar. - Por que alguns psicólogos tratam diagnóstico como se fosse um palavrão?
Porque foram ensinados assim. Muitos saem da faculdade com um pavor quase ideológico de nomear o sofrimento alheio. - E se eu me sentir “rotulado” depois de receber um diagnóstico?
Essa é uma conversa importante pra ter com o psicólogo. Um bom profissional vai te explicar que o diagnóstico não é uma sentença de vida, mas um mapa para entender o que está acontecendo e buscar o melhor tratamento. - Quanto tempo leva para receber um diagnóstico?
Depende da complexidade do caso. Em alguns casos, uma boa avaliação clínica em poucas sessões já é suficiente para levantar hipóteses. Em outros, pode levar mais tempo e envolver aplicação de testes ou encaminhamento para outros profissionais. - O diagnóstico pode mudar com o tempo?
Pode sim! Diagnóstico não é tatuagem. Ele pode ser revisado à medida que o psicólogo conhece melhor você, observa sua evolução ou recebe resultados de avaliações complementares. - Se o psicólogo não quiser me dar um diagnóstico, o que eu faço?
Seja direto: pergunte por que ele não está levantando uma hipótese diagnóstica. Se a resposta não te convencer… talvez seja hora de buscar um novo profissional. - Um diagnóstico pode realmente mudar minha vida?
Não tenha dúvida! Um diagnóstico bem feito abre portas para tratamentos mais assertivos, evita anos de sofrimento desnecessário e te dá um senso de direção.
Palavras finais
Não diagnosticar um paciente que apresenta sinais claros de sofrimento psíquico não é um posicionamento filosófico, nem um estilo clínico, nem uma escolha de abordagem. É negligência.
Enquanto alguns psicólogos continuam se escondendo atrás de discursos vazios sobre não rotular, do outro lado da sessão tem uma pessoa real… sofrendo, adoecendo, perdendo oportunidades, relações, saúde e, em casos mais graves, a própria vida.
Se o profissional tem medo de diagnosticar… precisa estudar mais. Se a formação foi ruim… precisa correr atrás. Se tem dúvida… faça supervisão. O que não dá mais pra aceitar é a omissão disfarçada de cuidado.
Porque no final das contas, você não está pagando por acolhimento vazio. Está pagando por cuidado real. Por orientação. Por diagnóstico quando necessário.
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